A Oi nasceu da privatização do setor de telecomunicações nos anos 2000 e se expandiu rapidamente. No entanto, a estratégia de crescimento agressivo — marcada por fusões e aquisições mal estruturadas, altos níveis de endividamento e gestão controversa — comprometeu sua estabilidade financeira.
Em 2016, a companhia ingressou com o maior pedido de Recuperação Judicial da história do Brasil, buscando reestruturar uma dívida superior a R$ 65 bilhões e tornou-se um dos casos mais emblemáticos da história empresarial brasileira. Após anos em Recuperação Judicial, a empresa teve falência decretada e, poucos dias depois, a decisão foi suspensa, retornando temporariamente ao regime recuperacional.
O caso reacende debates fundamentais:
👉 Até onde vai o papel da recuperação judicial no Brasil?
👉 Quando a falência deixa de ser exceção e torna-se inevitável?
👉 Quais são os impactos para credores, investidores e para o próprio mercado?
1. Breve Linha do Tempo
- 2016 → A Oi entra com o maior pedido de Recuperação Judicial da história do país, com dívida bilionária.
- 2017 a 2023 → Renegociação de ativos, mudanças societárias e venda de unidades (como a divisão móvel).
- 2024 → Novo plano de reorganização é aprovado, com novas condições para pagamento de credores.
- 2025 → Decisão judicial decreta a falência por descumprimento do plano.
- Dias depois → A falência é suspensa e a empresa retorna à recuperação judicial enquanto o mérito do recurso é analisado.
Essa oscilação demonstra não apenas complexidade jurídica, mas também fragilidade de viabilidade econômico-financeira.
2. Por Que a Falência Foi Decretada?
A decisão de decretar a falência da Oi não foi precipitada ou isolada. Ela decorreu de um conjunto de fatores acumulados ao longo de anos, incluindo descumprimento do plano de recuperação judicial, inviabilidade econômica demonstrada e esgotamento dos meios legais de reestruturação.
Em termos jurídicos, a falência foi decretada porque a empresa deixou de cumprir sua principal finalidade dentro da Recuperação Judicial: manter atividades de forma sustentável e honrar os compromissos assumidos com credores.
A seguir, os fundamentos centrais que embasaram a decisão:
A. Descumprimento do Plano de Recuperação Judicial
O plano aprovado judicialmente funciona como um contrato processual obrigatório, vinculando empresa e credores.
No caso da Oi, houve reiterado descumprimento:
- parcelamentos não honrados;
- metas financeiras não atingidas;
- atrasos ou ausência de pagamentos previstos;
- divergências contábeis e inconsistências operacionais.
Pela Lei 11.101/2005, esse descumprimento autoriza o juiz a convolar a recuperação judicial em falência (art. 73, IV).Ou seja: o plano deixou de ser um instrumento de recuperação e passou a ser um indicador de inviabilidade.
B. Perda de Viabilidade Econômico-Financeira
A Oi enfrentava um desequilíbrio estrutural entre:
- geração de receita,
- custos operacionais,
- dívida acumulada.
Mesmo com venda de ativos relevantes — como sua operação móvel —, o fluxo de caixa não evoluiu para um cenário sustentável. Indicadores como:
- redução contínua de EBITDA,
- deterioração patrimonial,
- aumento do passivo externo,revelaram que a empresa não possuía condições de se manter competitiva no longo prazo.
C. Esgotamento dos meios de negociação
Após quase uma década de negociações, renegociações, aditivos contratuais, reorganizações societárias e tentativas de captação, ficou evidente que Não havia mais ambiente negocial capaz de produzir solução eficiente.
Credores estratégicos — incluindo financeiros e regulados — passaram a manifestar oposição ao prolongamento do processo, indicando perda de confiança no plano.
D. Impacto Sistêmico x Risco de Continuidade
Embora a Oi seja operadora de serviço essencial, sua manutenção artificial em operação já não representava preservação econômica do setor, mas sim:
- risco aos consumidores,
- insegurança jurídica para o mercado,
- atraso na reorganização de infraestrutura.
A falta de investimentos e degradação da rede de telecomunicações fortaleceram o argumento de que a continuidade da empresa sob o modelo vigente não atendia mais interesse público relevante.
E. Aplicação do Princípio da Falência como Solução de Ordem
No direito empresarial, a falência não tem caráter punitivo — ela é uma solução organizacional para insolvência definitiva.Quando a recuperação judicial deixa de cumprir seus objetivos — preservar atividade econômica, empregos e circulação de riqueza —, a falência passa a ser a medida adequada.
A decisão, portanto, foi técnica não havia mais recuperação possível dentro do cenário apresentado.
A inicial considerou principalmente:
- Descumprimento reiterado do plano de recuperação aprovado judicialmente;
- Incapacidade de honrar pagamentos negociados com credores;
- Projeções financeiras incompatíveis com continuidade da operação;
- Ausência de credibilidade empresarial para novas negociações.
A Justiça entendeu que, naquele momento, o objetivo da recuperação judicial — preservar a atividade econômica — havia se esgotado.
3. Por Que a Falência Foi Suspensa?
A decisão foi tomada pela desembargadora Mônica Maria Costa, da Primeira Câmara de Direito Privado do TJRJ. Ela atendeu a pedidos de bancos credores como Itaú e Bradesco e reverteu a falência que havia sido decretada pela 7ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro na última segunda-feira (10).
Os bancos sustentaram que interromper o funcionamento da empresa pode gerar prejuízos irrecuperáveis para credores, clientes e funcionários. Eles pediram nova oportunidade para que a companhia cumpra o plano aprovado na recuperação, incluindo a venda de ativos capazes de fazer caixa para o pagamento de dívidas.
A desembargadora que analisou o recurso deu razão aos credores, afirmando que a liquidação antecipada e desordenada implicaria em desvalorização abrupta dos ativos da companhia, além de causar prejuízos ao público, devido aos relevantes serviços prestados pela O
A suspensão atendeu argumentos estratégicos, entre eles:
- Preservação da continuidade de serviço essencial de telecomunicações;
- Risco de prejuízo maior aos credores em liquidação imediata;
- Existência de possível caminho de reestruturação ainda não esgotado;
- Princípio da falência como ultima ratio — última alternativa.
Em outras palavras:
Ainda havia dúvidas se liquidar tudo agora seria melhor do que tentar recuperar.
Foco na continuidade dos serviços essenciais de telecomunicações
A decisão registra que a Oi, por meio da unidade Oi Soluções e de suas controladas, mantém contratos com órgãos públicos e grandes empresas privadas, incluindo serviços de voz, dados, conectividade, soluções digitais, redes críticas e apoio a sistemas de defesa aérea (CINDACTA). O relatório do gestor judicial aponta milhares de contratos ativos com o setor público e privado e fluxo de caixa ainda negativo, mas com receitas recorrentes e ativos relevantes, incluindo imóveis, participações e direitos em arbitragem com a Anatel.
A relatora ressalta que a descontinuidade abrupta desses serviços de telecomunicações, inclusive os considerados essenciais, teria impacto direto sobre administração pública, instituições financeiras, empresas e usuários em geral. Nesse contexto, a liquidação ordenada de ativos dentro da recuperação é apontada como meio mais adequado para conciliar pagamento de credores e continuidade dos serviços até eventual transição para novos operadores.
4. O Que Essa Reviravolta Ensina?
A oscilação entre decretação de falência e retorno à recuperação judicial não é apenas um detalhe processual — ela revela aspectos fundamentais do sistema jurídico-empresarial brasileiro e expõe ensinamentos valiosos para empresas, administradores, investidores e operadores do direito.
Um dos primeiros ensinamento é de que a Recuperação Judicial não substitui gestão eficiente
A Recuperação Judicial é um instrumento jurídico criado para possibilitar a reorganização da empresa quando ainda existe viabilidade econômica, mas ela não corrige gestão ineficiente, decisões estratégicas equivocadas ou ausência de governança.
Muitas empresas tratam a RJ como uma prorrogação artificial da vida empresarial,
quando, na verdade, ela exige reestruturação profunda — e não mero adiamento.
A Oi ilustra isso: mesmo após anos de renegociação e ajustes estruturais, a empresa continuou acumulando passivos e dificuldades operacionais.
Segundo ensinamento valioso: Governança Corporativa é indispensável — especialmente em mercados regulados
A ausência de governança clara, indicadores transparentes e decisões alinhadas aos controles internos é um dos fatores que mais contribuem para a deterioração de organizações de grande porte.
No caso da Oi, a falta de previsibilidade e coerência estratégica — somada a mudanças políticas internas e operações societárias complexas — comprometeu sua capacidade de adaptação.
Empresas reguladas, como telecomunicações, energia e saúde, não sobrevivem sem compliance, transparência e planejamento.
o terceiro e um dos mais valioso ensinamentos: Endividamento sem projeção realista de retorno inviabiliza qualquer reestruturação
A RJ tem como base a premissa de que a empresa conseguirá gerar caixa suficiente para pagar credores e se manter operacional.
Quando a dívida supera a capacidade de faturamento e o plano depende de eventos incertos — como venda de ativos estratégicos ou investimentos externos hipotéticos — o processo deixa de ser econômico e passa a ser impraticável.
O caso Oi mostra que o crescimento sem sustentabilidade financeira pode transformar-se em colapso inevitável.
Credores têm limites e o Judiciário também
A Recuperação Judicial não é infinita. Há um ponto em que:
- a continuidade da empresa já não protege a economia,
- os credores deixam de confiar na reestruturação,
- e a falta de cumprimento do plano gera insegurança jurídica.
Nesse cenário, a falência se torna o caminho mais seguro, pois permite:
- organização dos pagamentos,
- preservação patrimonial,
- e encerramento formal da atividade empresarial.
O movimento observado no caso Oi evidencia exatamente esse limite entre tentar recuperar e reconhecer a inviabilidade.
Lição:
O episódio da Oi mostra, de forma concreta, que a sobrevivência empresarial não depende apenas da lei, mas da maturidade organizacional.
A Recuperação Judicial é um instrumento — não um salvador . Ela só funciona quando há gestão, governança, estratégia e viabilidade.
O caso demonstra, na prática, o limite entre recuperação, tentativa de reorganização e inevitabilidade da liquidação.
5. E Se a Falência For Confirmada? O Que Acontece?
Caso o tribunal mantenha a decisão de falência, os efeitos jurídicos serão os seguintes:
Para a empresa
- Substituição definitiva da administração pela administração judicial;
- Fim da autonomia administrativa dos gestores atuais;
- Início do processo de liquidação ordenada do patrimônio.
Para os credores
- Aplicação da ordem legal de pagamento (art. 83, Lei 11.101/2005):
- Trabalhistas
- Garantias reais
- Tributários
- Quirografários
- Subordinados (investidores, acionistas etc.)
- Trabalhistas
Para funcionários
- Possível manutenção temporária de algumas atividades, mas com expectativa de desligamentos e encerramento gradual.
Para consumidores
- Serviços podem ser mantidos temporariamente, mas a longo prazo poderão ser vendidos, transferidos ou descontinuados.
Na prática, a empresa deixa de ser um negócio e torna-se um processo de liquidação judicial.
Conclusão
O caso Oi marca um divisor de águas no direito empresarial brasileiro. Ele mostra que:
📌 A recuperação judicial é um instrumento valioso — mas não é ilimitado, nem serve para perpetuar empresas inviáveis.
Se a empresa conseguir reorganizar seus números, poderá continuar existindo — de forma muito diferente do passado.
Se não, a falência finalmente se consolidará como caminho mais seguro para credores e para o mercado.
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